Creio que qualquer pessoa com o mínimo conhecimento da língua portuguesa consegue, ao ler a frase acima, descobrir a tradução da sua parte francesa, ao menos a tradução literária da frase. La petite mort.
A pequena morte.
Mesmo não sendo muito chegado ao carnaval, desejo a todos os carnavalescos de rua, de bairro, de avenida, não um carnaval do sexo, da luxuria, da festa da carne(?), mas um carnaval repleto de pequenas mortes. Um carnaval cheio de “Le petite mort”.
Com a chegada do carnaval, o que mais vejo nas redes sociais é uma exaltação quase que “carnateista”, se é que existe o termo, do sexo não do carnaval. Seria como se o carnaval se resumisse apenas a quatro, cinco ou seis dias de férias em uma ilha paradisíaca chamada Brasil, onde o sexo é elemento obrigatório. Os que namoram, no carnaval, devem terminar o namoro, já os que estão solteiros, continuem solteiros e venham para a festa. Venham transar o carnaval.Sinceramente, eu não gosto deste carnaval. Um carnaval sem “La petite mort”. Um carnaval frio.
“La petite mort” é exatamente assim que os franceses se referem àqueles poucos segundos, minutos, horas, que sucedem o ato sexual. A pequena morte. A expressão refere-se a incapacidade de realizar qualquer atividade, seja ela intelectual, seja braçal, seja qual for, após esse orgasmo, esse gozo. Você já esteve tão feliz, mas tão feliz que não conseguia fazer nada além de: Ficar feliz? Chorar? Rir? Chorar e rir? Estar em um momento no qual pensar, andar, correr é impossível? É exatamente esse o momento, é exatamente essa La petite mort que desejo a você nesse carnaval. Um carnaval intenso, um carnaval de entregas, um carnaval onde o gozo não seja objetivo, seja consequência.
Imagine um carnaval no qual o beber não seja obrigação, pegar geral não seja uma regra. Um carnaval sem máscaras. Um carnaval em que ”amor de carnaval” durasse mais que os quatro dias. Não que fosse um amor imortal, mas que, como diz o poeta “fosse chama”, consumisse. Um carnaval que queime, que esgote toda a energia, que faça com você o mesmo que chama faz com o amor do poeta. Queime por inteiro.
Se você vai para avenida, vá por inteiro. Vá queimar-se no samba. Vá esgotar-se pela sua escola, vá sorrir e chorar com o seu samba enredo. Se você vai para o bloco de rua, vá cheio de vida. Vá curtir o carnaval, vá passar a sua alegria a todos e todas. Vá queimar toda sua alegria. Se você vai para o baile, queime-se por completo. Dance, pule, cante, veja e seja visto. Se vai ficar com a família, queime-se dela e com ela, pule no sofá, na tv, na sala, faça a sua festa. Se vai namorar, namore com todo o seu fogo. Queime-se com o seu amor.
Não importa onde você esteja, deixe a chama do carnaval te queimar.
Um queimar que te mostre a vida, que te traga a vida. Que te deixe tão cheio de vida que por um instante, por apenas um instante, seu corpo se esvazie de toda ela, deixando a você apenas a sensação que queimou-se por completo, viveu-se por inteiro, e ai, você perceba que os franceses souberam descrever o gozar a vida plenamente, viver um amor em sua plenitude, em apenas três palavras.
La petite mort.
Bom carnaval.