Dentre as minha leitura de Freire, há uma que sempre me remete ao titulo em questão. Medo e Ousadia. Nela o autor mostra a necessidade que o professor libertador tem de sonhar e pensar:
“o educador libertador está com os alunos, em vez de fazer coisas para os alunos. Nesse ato conjunto de conhecimento, temos a racionalidade e temos paixão. Isto é o que sou – um educador apaixonado -, porque não entendo como viver sem paixão.” (Medo e Ousadia, Pag 204)
Essa leitura sempre me levou a ver o professor como um caçador de moinhos de vento, deixe-me explicar melhor.
No livro Dom Quixote de la Mancha apresentam-se dois personagens: Dom Quixote, com sua visão de mundo um tanto quanto idealizada, e seu fiel companheiro Sancho Pança com a visão um pouco mais realista das coisas e, para mim, esses dois retratam bem o professor em sua prática.
Somos idealizadores, somos românticos, não o romântico que manda flores, ou o romântico que escreve um poema, somos o romântico em sua essência. Somos aquele que acredita. Somos aquele que, assim como Dom Quixote, os outros chamam de bobo e como é gostoso ser bobo, há um texto da Clarice Lispector Das vantagens de ser bobo, onde, entre outras coisas maravilhosas sobre ser bobo, ela ressalta:
“Bobo é Chagall, que põe vaca no espaço, voando por cima das casas. É quase impossível evitar excesso de amor que o bobo provoca. É que só o bobo é capaz de excesso de amor. E só o amor faz o bobo.”
Sim, assim como Dom Quixote faz do moinho de vento o dragão, nós professores fazemos da nossa aula um show, um espetáculo. É comum escutar alunos que reclamam: O professor acha que eu só tenho essa ou aquela matéria. Engana-se o aluno que assim pensa, nós sabemos que você tem outras matérias e desafios na vida, mas somos bobos, para nós a nossa matéria sempre será a mais importante.
Mas não é apenas de sonho, que vive o professor, somos Sancho Pança também. Sonhamos sim, mas não sonhamos sozinhos e tão pouco esquecemos da nossa realidade e é justamente pela mudança que sonhamos. O nosso desejo de mudar, de transformar o mundo, é tão grande que sonhamos com o diferente. E esse é o primeiro passo de uma longa caminhada.
E, nessa caminhada, não há espaço para o esperto, o malandro. Não há espaço para atalhos. O bom professor definitivamente não é aquele que ensina as malandragens da vida, que ensina os atalhos para fazer mais rápido, ou melhor. O bom professor é aquele que caminha com o aluno, é aquele que faz com o aluno o seu caminho e apenas assim, nós conseguiremos mudar.
E no dia em que nos perguntarem se vale a pena ser professor, responderemos: Se for por amor às causas perdidas, se for por acreditar, se for por sonhar. Sim, sempre vale apena.